6.12.06

Madame Bovary e os beijos roubados..

Confesso que o realismo de Flaubert não me conquistou de cara.. E a sua tão propalada escrita perfeita não surge de imediato na tradução.. Mas, com um pouco de persistência, a história engrena.. E vão surgindo os tipos tão bem delineados pelo escritor naquela triste aldeia de Yonville: Humais, o farmacêutico medíocre e puxa-saco; Rodolphe, o amante aproveitador e cínico; Charles, o esposo tapado e acomodado; Lheureux, o comerciante filha-da-puta e traiçoeiro..

Cercada por essa gente, a pobre Emma Bovary vai em busca de seus sonhos românticos que vão terminar em tragédia.. Quem nunca teve seus dias de Madame Bovary? De viver 24 horas por dia em função de uma paixão desmedida, sem ligar para dinheiro, para o que os outros vão dizer, para o trabalho e a rotina? Sua história é um alerta, um chamamento à realidade, mais do que uma censura pelo seu comportamento.. Mas é impossível não se apiedar da sua trajetória.. Ela, pelo menos, tentou viver além, não se conformou e pode sentir os prazeres dos tais beijos roubados..

Duas cenas me marcaram: a primeira é a do dia da exposição de animais na cidade, onde vão se revezando o discurso do representante do prefeito sobre trabalho, os deveres dos cidadaõs etc.. e as cantadas de Roberth fazendo juras de amor à Emma.. A construção ressalta a diferença entre o mundo real e o romântico, ao mesmo tempo que aponta para a falsidade das duas falas.. A outra é a da divertida discussão entre Humois e o padre Bournisien sobre religião no quarto em que se encontrava o corpo de Bovary (sim, ela se mata no final), cena que faz saltar aos olhos a insensibilidade e a mesquinhez desses personagens..

Fiquei com vontade de reler Anna Karenina e fazer a comparação entre duas das mais importantes personagens da literatura universal.. Deixo aqui duas citações de trechos do romance que, na minha opinião, exemplificam bem o estilo de Flaubert:

"A palavra humana é como um caldeirão fendido em que batemos melodias para fazer dançar os ursos, quando antes queríamos enternecer as estrelas"

"Tudo mentia! Cada sorriso ocultava um bocejo de enfado, cada alegria uma maldição, todo prazer o seu desgosto, e os melhores de todos os beijos não deixavam nos lábios senão uma irrealizável ânsia de voluptuosidades mais intensas"

2 comentários:

Anônimo disse...

Várias coisas, my friend.
1) Quanto ao New Order, você perdeu Crystal e Regret, nessa ordem. E, na boa: se perdeu Regret, perdeu uma parte incrível do show (mas essa foi uma sensação bem particular...)
2) Bom que você voltou a escrever. A cada dia acho mais difícil ler coisas inteligentes na internet.
3) Espero que você não comece a namorar tão cedo, porque aí o blog morre de novo... para ressuscitar no próximo interlúdio.
4) Adorei o "private jokes". Me bateu uma inveja daquelas! (Não em relação à pessoa, mas sim às jokes).
5 - Adorei o "sim, ela morre no final".

\o/ disse...

muito bom bjs